
É com muito prazer que escrevo aqui sobre a estreia do novo espetáculo da Cia Teatral Controvérsias, fundada em janeiro de 1997 e que desenvolve um trabalho sério e importante no município de Pindamonhangaba e região.
O Fegão Folhart esteve na estreia e traz aqui dois pontos importantes para reflexão num trabalho feito com tanto cuidado e desenvolvido durante um longo tempo pelo grupo, que dessa vez se desafia e entra em um universo bem diferente do que estava habituada em cena.

Primeiro ponto é a escolha do texto de Albert Camus “Estado de Sítio”, peça teatral que teve sua estreia em 1948, é uma das obras mais importantes do jornalista e dramaturgo francês. O grupo então se apropria do texto e inicia um trabalho fundamental para nós artistas, que é o de responder o porquê dessa escolha. Ali na montagem não vemos apenas a Guerra Civil Espanhola pensada pelo dramaturgo, mas também vemos o caos que hoje vivemos no Brasil. É bárbaro e triste ao mesmo tempo, ver um texto tão atual. Acredito que aí o grupo ainda irá encontrar outros pontos contundentes para explorar enquanto reflexão espetáculo/realidade e assim cada vez mais discutir a situação em que nos encontramos hoje. Quanto mais pontos encontrar, mais o texto conversará com o público. A estrutura de Camus dá muita margem para isso e o trabalho já nos oferece várias reflexões e o que é pior, identificações. Na minha forma de pensar, ele ainda não me coloca dentro do espetáculo, ainda não me vejo ali, ainda contemplo o produto, porém já sinto a necessidade de me sentir dentro e refletir ali junto. Acredito na potencia da montagem enquanto provocação, mas por enquanto ela me é contemplativa. Não me senti provocado, apenas vi a provocação.

Segundo ponto as interpretações de jovens atores ainda num processo de estudo, e outros já com uma carreira desenhada com o Teatro na região. Num olhar no conjunto a direção precisa conduzir as interpretações para uma mesma linguagem, é visível que alguns já dominam a técnica e nos levam para o subtexto do texto como é o caso de atores como : Rodrigo di Paula com sua governadora cheia de empatia e verdade, Lala Machado com seu talento avassalador e uma técnica precisa que hipnotiza o espectador, Marcos Cuba é uma surpresa para mim o seu domínio e jogo, Mauro Morais e sua personificação é de grande força e acho que ainda nos trará grandes descobertas pois é uma personagem que nos dá muitas possibilidades e adorei sua escolha e desafio. Guilherme Martins é outro que me surpreendeu e fica aqui só uma dica, você pode mais, cuidado com a forma. E vejo nos mocinhos vividos por Keli Santos e Houston Charles uma outra forma na interpretação, ela é mais “poética” e menos realista como os outros, senti aí um desafio para a direção ou também seja uma proposta. Daí fica aqui apenas um incômodo.
Quanto aos outros personagens vejo o desenho e a proposta de uns, vejo uma verdade em outros, e friso a importância da técnica para determinadas cenas onde o ritmo as vezes cai e não é a proposta, é respiração cansada. Identifico isso na briga da família que começa muito bem, mas depois o ritmo e a falta de força e ritmo no final, não é suficiente para o que pede o espetáculo. Não é fácil fazer um espetáculo onde atores são contrarregras, se transformam em vários personagens e cantam! É um espetáculo que trará para todos um grande aprendizado, que orgulho de ver meus alunos, alunos da nossa Fêgo Camargo, no meio de um projeto desse porte. Há muito tempo atrás assisti um espetáculo do mesmo Camus, mas os atores não tinham esse trabalho corporal de vocês, não tinham essa apropriação do texto e o espetáculo perdia muito com isso. Então, vida longa ao Estado de Sítio! Vida longa a resistência da Cia Controvérsias! Afinal o Estado de Sítio é agora!
Não perca! Vale muito a pena!
Comentarios